Bem Dito

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McDonaldização da Fé



O dinamismo das atividades no mundo atual dá origem a uma geração fast food, que tem pressa, que querem tudo instantaneamente. Conhecendo a maior rede de fast foods do planeta, a McDonald’s, a “Mcdonaldização” é uma metáfora levada para o campo religioso para representar as características que permeiam notadamente os grupos neopentecostais.



Com o tempo e o advento da pós modernidade e de suas características, dentre elas a pluralidade, o campo religioso dito evangélico foi se diversificando para atender a uma demanda diferente daquele que surgiu no período pré e pós Reforma Protestante. Assim se estabelece uma disputa entre denominações em busca da angariar membros para suas congregações e em consequência aumentar arrecadação, prestígio e popularidade. Isso é claro não só acontece no meio evangélico, mas é um fenômeno religioso que abrange católicos, judeus, muçulmanos, religiões afro e outras também. É feito uma análise de mercado e se baseando na pluralidade são traçadas estratégias para que fiéis sejam atraídos pelo que a denominação religiosa tem a “oferecer”, os chamados bens simbólicos. A tradição religiosa, que antigamente podia ser imposta pela autoridade, agora tem que ser colocada no mercado. 



Os protestantes são divididos em alguns grupos e um deles, mesmo que pouco ou nada tenha a ver com a igreja oriunda da Reforma, é o grupo conhecido como neopentecostal que tem como características a defesa da teologia da prosperidade, o uso da mídia de massa, sobretudo a TV. São exemplos desse grupo a Igreja Universal do Reino de Deus (1977) e Igreja Internacional da Graça de Deus (1980). Este grupo também pode ser classificado como imagético, onde a idéia do espetáculo, da teatralização e o uso massivo da TV é mais evidente.



Devido aos fenômenos de pluralismo, trânsito e mercado religioso no Brasil muitas igrejas mesclam inúmeros elementos para que os fiéis se sintam adequados aquele meio e permaneçam por mais tempo e não sejam seduzidos por outras propostas do mercado religioso. Assim é possível que num mesmo espaço religioso ocorram diferentes manifestações da experiência religiosa. A centralização no indivíduo, considerando os “produtos e serviços” religiosos ofertados num amplo pluralismo e na concorrência do mercado religioso, constitui uma verdadeira concepção do self. O self é uma das chaves para explicar o crescimento dos neopentecostais. Dessa forma não há contestação eclesiástica abrindo espaço para um sincretismo religioso na experiência individual. 



Voltando ao termo “McDonaldização da fé”, a metáfora faz-nos lembrar que as igrejas neopentecostais, como a IURD e a Renascer, apresentam cada dia da semana com um cardápio diferente, no dia x, o culto da Libertação, no y, do empresário, no dia w, da família e no f, a terapia do amor. O fiel servi-se daquilo que lhe agradar, essa é a lógica de mercado imposta nesta sociedade neoliberal. Nessa concorrência religiosa quem “oferecer” as melhores e variadas bençãos leva o fiel.



Os grupos imagéticos tem investidos pesado em propaganda visual e crescem de forma absurda, em contrapartida os protestantes históricos estão estagnados e perdido membros para estas denominações, pois o primeiro grupo defende a valorização de leitura e conhecimento da Palavra de Deus, o que demanda tempo e dedicação que é o que estes novos tipos de crentes não querer despender, já que buscam resultados rápidos e bênçãos materiais. O apelo visual se tornou maior numa sociedade que valoriza mais o poder da imagem do que o poder da palavra. A pomba estilizada e o escrito “Pare de sofrer” são características típicas da identidade visual da Igreja Universal do Reino de Deus, o peixe, símbolo histórico do cristianismo foi patenteado pela Igreja Renascer em Cristo; a sarça ardente, símbolo da Igreja Presbiteriana do Brasil (IPB) são marcas de uma política de identidade visual, numa sociedade imagética, assim como os arcos dourados, fazem parte da identidade visual do Mcdonald’s. 



O que nos é oferecido não é uma refeição caprichada, no ponto, ou bem passada e sim os produtos feitos de forma rápida e desleixada, a carne ainda com sangue e a alface impregnada de pragas. O povo que precisa de alimento sólido o tem preterido e preferido alimentos, se é que podemos chamar de alimentos, instantâneos. Assim tem sido a fé comercializada, eventos promovidos não para Glória de Deus e sim para satisfação de um povo que adora um circo, um espetáculo com roupagem gospel, como  o proporcionado pela Banda “Diante do Trono”, ligada à Igreja Batista da Lagoinha de Belo Horizonte, que constantemente enchem estádios nos seus shows.



A fé não pode ser rotineira, litúrgica, pois para se conseguir mais sucesso (leia-se mais fiéis) torna-se necessário ter eventos espetaculares, estádios lotados, curas, milagres, sonhos, adivinhações, aparições midiáticas que sejam respostas do tempo do “aqui e agora”, mais ao gosto dos (neo) pentecostais do que os discursos transcendentais dos grupos reformados. Os grupos neopentecostais usam um discurso facilmente digerível - “fast food” - que procura agradar as massas (cura, prosperidade financeira, terapia do amor, entre outros), levando a intensificação do trânsito religioso brasileiro. Além disso a pauta deste grupo é ocupada pela apresentação de soluções de problemas cotidianos (fome, desemprego, falta de assistência médica e educacional), onde o estado mínimo neoliberal se ausenta, gerando uma maior eficácia simbólica no seu discurso. Além disso, intensifica-se o mercado religioso em busca do fiel/consumidor, marcando a mercantilização do sagrado, numa fé mais ligado ao self, caracterizando um relativismo ético/religioso com uma certa ausência de contradições nesse menu religioso à la carte, sendo que as denominações neopentecostais crescem por se encaixar mais nesse perfil que combina religiosidade, mercado e espetáculo.


#JuliusReformado

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